quarta-feira, maio 23, 2007


Já não faço mais tanto esforço para compreender. Embora ainda viva numa cidade em que amanhece e anoitece com o relógio marcado, ainda que meus dias funcionem de acordo com os óbvios de levantar, trabalhar, pagar as contas e voltar para casa, ainda assim, não me esforço mais para tentar compreender.
Esse desprendimento de energia, muito comum aos que têm sede, é bem menor hoje em dia por uma questão muito simples que não envolve o secar, apenas a administrar melhor a energia, a atenção, às águas. Então não me pergunte como chegamos até aqui. Eu realmente não sei. Poderia dizer que a geografia limitada da cidade e a falta de opção nos afunilaram na noite, vai saber, dos encontros, das surpresas, das afinidades da vida, daquilo que é afinado ou não.

Algumas taças de vinho depois e muitas referências em comum. Efeitos do alcool ou da fumaça ou da atmosfera da madrugada, fala-se muita besteira para preencher a noite e despertar a atenção. Sabe que os meus melhores amores começaram de um silêncio desconfortável, de um profundo silêncio de olhar nos olhos e não saber o que dizer ou onde colocar as mãos? Nasceu assim, de um observar de causar arrepio na nuca, do detalhe que muitas vezes ascende, a ponta de um sorriso, a maneira de manipular o cigarro, a ironia fina de canto de boca, a inteligência simples que abre as portas. Na ausência de palavras, entregue ao momento, muitas vezes me peguei pensando 'agora não dá mais para voltar'. A cidade é pequena, ela reúne muito mais do que afasta, nós temos algumas pessoas em comum, alguns lugares também. Até que ele me veio proteger e roube-me um beijo.

Eu desisti de compreender e confesso que desconfio de quem exibe certezas e conceitos. Desconfio de gente que declama verdades. De gente que não se permite a interrogação, o não saber, o aprender o que já é, mais uma vez. Me vestir do óbvio para não saber. Caminhamos em silêncio de lua cheia e estrelas acesas. Esta muito frio. Eu olho para trás e você me diz:

- Agora não dá mais para voltar. Agora eu vou te beijar.

Ai eu paraliso e pergunto: quem é você???

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